Pensamenteando

Xadrez de bruxo

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Armou a isca com o cuidado da última chance. Um glifo de paralisia bruxuleava abaixo do mercenário contratado, mas é claro que o freelancer não via esse brilho azulado, apenas a pessoa que realizava o feitiço recebia a indicação. Foi uma medida de segurança imposta pelo alto escalão do Ministério de Controle das Artes Arcanas. Diziam que a quantidade de baixas por glifos que eram conjurados e esquecidos, encontrava-se como a principal causa de mortes entre os praticantes de magia.

A seus pés, uma tênue rosa dos ventos emanava aquela luz efêmera – um glifo de repulsão –, uma garantia extra que ele não seria atingido, caso as coisas não saíssem como o esperado. Antes de carregar o ar com sua energia elemental, e fazer com que pequenos raios trepidassem ao longo do cajado, ele respirou fundo: odiava o cheiro de madeira queimada. Parecia que o aroma ficava impregnado nas roupas mesmo horas depois de qualquer feitiçozinho. Depois das horas de treinamento no laboratório de práticas arcanas e biologia II (cortes de verbas), era obrigado a tomar um banho e remover o odor com uma poção caríssima. Mas ei, ossos do ofício; ninguém chega a trainee de mago nível três sem trabalhar duro.

Deu o sinal para o mercenário. Após de meses de pesquisa, ele e seus colegas de academia haviam concluído que o necromante deveria estar ali, esperando qualquer um que ousasse perturbar seu sono.

O homem com armadura de cota de malha puxou a alavanca de metal ao seu lado, que se moveu sem esforço aparente. O ruído de alavancas rodando e se encaixando dentro das paredes de pedra encheu o ambiente. Um dos dois homens suava frio.

A porta se abriu para um cômodo vazio. Ele ficou olhando sem entender. O mercenário olhou para ele, depois para o cômodo vazio, depois para ele de novo, e deu de ombros enquanto apontava com a cabeça para a porta, como quem pergunta: E aí doutor, agora o que?

O trainee de mago nível três dissipou a energia que vinha concentrando. Soltou um suspiro de trabalho em grupo mal feito, e foi caminhando até o aposento. Lançou um feitiço de detectar mágica para saber se havia alguma armadilha, mas não sentiu nada. Até que sentiu um empurrão.

O mercenário o havia jogado em direção ao cômodo, que contendo agora um humanoide estupefato, já não estava vazio. Antes que pudesse começar a gritar, perguntando que o que aquilo significava, perdeu as palavras quando viu o freelancer traidor conjurando seu próprio glifo de paralisia. Ao recuperar o equilíbrio, sentiu sentiu seu corpo imóvel e já não podia falar mais nada.

Mas podia pensar.

E então, pela primeira vez, começou a considerar que deveria ter duvidado da boa intenção de um mercenário – que topou ir atrás de um necromante –, sem tentar cobrar mais caro.